domingo, 2 de dezembro de 2007

Africa: dinheiro traz felicidade?

"Pelo amor de Deus, parem de ajudar a África!", afirma James Shikwati, economista do Quênia.
A primeira vista parece praticamente impossível aceitar essa colocação, seria como abandonar o espírito fraternal típico dos mamíferos, que nos faz sentir responsáveis pelas péssimas condições de vidas de alguns de nossos semelhantes.
Percebamos que por trás desse pensamento mora uma idéia simples, naturalmente desprezada em outras ocasiões: dinheiro traz felicidade.
Quando vibramos com maiores níveis de recursos destinados ao continente Africano ou com uma dívida externa perdoada, estamos de alguma forma presos ao pressuposto de que esse montante será em sua maioria investido, surgindo como a saída para esses países que em breve poderão "andar com suas próprias pernas". Ou seja, que o dinheiro será capaz de melhorar o nível de bem estar social dessas regiões.
O fato é que normalmente é fácil fechar os olhos para elementos que seriam fundamentais para a obtenção desse resultado.
Primeiro não parece muito comum analisar as mudanças nos incentivos gerados por esse tipo de benevolência, afinal um país que tem costume de não honrar suas dívidas e ser naturalmente perdoado no futuro, tem motivação suficiente para não honra-la.
Segundo, não é comum se discutir qual o real volume de inversão, pois nos modelos de crescimento econômico a palavra de ordem é investimento, seja ele em capital físico ou humano, existe um consenso aparente de que maiores taxas de investimento são responsáveis por um maior nível de renda no longo prazo. Assim, se a maior parte desses recursos se destina simplesmente a compra de comida ou é desviado via corrupção o objetivo final dificilmente torna-se factível. Uma analogia simples seria imaginar um individuo de baixa renda que adquire uma dívida para a compra de comida, roupa, relógio, bicicleta, bolsa, sapato, computador e uma Tv digital, tornando impossível honrar sua dívida no ano seguinte, pois esse tipo de consumo não costuma apresentar rendimentos positivos, com exceção dos atletas do Quênia que na compra de roupa e tênis apropriados vêm receber seus prêmios nas maratonas internacionais, ou seja , os recursos não são utilizados para gerarem mais dinheiro, apenas para satisfazer necessidades pontuais.

Quanto ao primeiro ponto de questionamento, o especialista Queniano parece tecer a maioria de seus comentários sob essa premissa de que as ajudas modificaram a estrutura de incentivos nos países pobres do continente africano. Segundo ele, "os africanos aprendem a ser mendigos, e não independentes" E levanta um ponto adicional. As ajudas da ONU ao continente africano despejam nessas regiões uma enorme quantidade de produtos agrícolas americanos e europeus, altamente subsidiados, que chegam de graça à maioria das pessoas que passam fome e posteriormente circula no mercado negro a baixos níveis de preço. Dessa forma, as forças de mercado tornam impossível o desenvolvimento da agricultura local, afinal o excesso de oferta reduz o preço dos alimentos e inviabiliza a produção por parte dos agricultores locais.

Em relação ao segundo ponto, duas matérias publicadas recentemente levantam seguem essa linha:

O espanhol El país publicou dia 03 de dezembro desse ano a matéria: La ayuda fracasa, pero África despega, apresentando argumentos a favor da continuidade da ajuda, mas apresentando as principais justificativas para os resultados pífios da política de transferência ocidental, dentre eles a corrupção surge como elemento principal, além de questionar o tipo de investimento que normalmente era realizado, falando inclusive em um novo tipo de ajuda.

No Wall Street Journal o problema gerou discussão quando o Banco Mundial bloqueou o empréstimo às Filipinas, argumentando principalmente que grande parte do dinheiro seria desviada por corrupção e que não era evidente a capacidade de prover a estrada a qual se propunham, levando a crer que, como em muitos casos, a corrupção não é a causa do problema e sim um sintoma de imcompetência administrativa e burocrática do país. De uma maneira geral, essa ação foi considera como parte de um plano maior do Banco Mundial de lutar contra a corrupção nos paises beneficiados.

Dessa forma, já fica mais claro que os argumento a favor de teorias aparentemente "desumanas" são bem fundamentados e no mínimo servem para um debate maior acerca desse problema, ampliando a discussão.

É válido perceber aqui algo sutil que poderia passar facilmente despercebido. Existe um sentimento que parece ser comum entre os países subdesenvolvidos: "estamos assim porque fomos explorados no passado e logo vocês (os paises ricos) são responsáveis por nossa situação atual e, assim sendo, devem nos ajudar" No entanto, os problemas que inviabilizaram o desenvolvimento advindo do grande volume de inversões externas foram sintomas de falhas administrativas, má utilização dos recursos.

Ou seja, tem-se aqui uma confortável posição de falhar na provisão de investimentos rentáveis e culpar alguma força do mal (tipo: o Brasil nunca vai pra frente, uma espécie de condenação mística*) ou culpar o constante espírito de porco das economias dominantes, que planejam simultaneamente o sucesso econômico de sua nação e o fim deplorável para o restante.

Obviamente que não podemos incorrer no erro de considerar que as economias dominantes estão sempre com boas intenções, contudo seria interessante refletir: Até quando vamos nos esconder sobre a manta da conspiração?

* “Quando nasci veio um anjo safado/O chato do querubim/E decretou que eu estava predestinado/A ser errado assim“
Chico Buarque



3 Comentários:

Às 4 de dezembro de 2007 às 01:52 , Anonymous Anônimo disse...

Este comentário foi removido pelo autor.

 
Às 9 de dezembro de 2007 às 18:48 , Blogger Unknown disse...

Este comentário foi removido pelo autor.

 
Às 9 de dezembro de 2007 às 18:51 , Blogger Unknown disse...

acho que precisamos de uma proposta clara, e quem sabe, definitiva. Ou pelo menos um primeiro passo, para o Brasil possa aprender a investir o dinheiro emprestado.

o que que podemos fazer a nossa volta?

eu particularmente acho que movimento estudantil não é mais uma saída.

 

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